sábado, 8 de janeiro de 2011

Mártires

Martyrs, 2008
Dirgido por Pascal Laugier, com Morjana Aloui, Mylène Jamponoï e Catherine Bégin.

Palavras chave: vingança, trauma



Há muito os franceses, ou melhor, o cinema europeu em si vem tentando ganhar fama e público com suas produções de terror/horror, muitas vezes apelando para a violência extrema e para uma espécie de sobrenatural, muitas vezes mais inteligente que filmes comerciais americanos do gênero (coisa que não é muito difícil) e com uma carga violenta ainda maior e priorizando as sensações de desconforto, nojo e principalmente tensão. Nesse filme, “Martyrs”, dirigido por Pascal Laugier, eles exploram e tentam criticar a violência e a recepção da mesma no mundo, pelas pessoas e a justificação dela. Diferente dos filmes mais diretos, esse cria certa polêmica e contradição, pois, ao mesmo tempo em que propõe uma reflexão ou raciocínio sobre a violência, ele extrapola nessa, podendo, claro, camuflar a verdadeira intenção e criar algo passageiro e “mais do mesmo”.

Pascal consegue a proeza de misturar gêneros das grandes indústrias mundiais de filmes de horror/terror: em um momento, o filme é violento e usa características e fórmulas americanas e em outros momentos, o filme se torna surreal e tenebroso como os filmes asiáticos, ou melhor, japoneses de gênero, cujo talento (e quanto talento têm) é criar pânico e uma extrema tensão, envolvendo alucinações e espíritos, assombrações, etc. Nesse meio, ele consegue criar um drama que é a única coisa que consegue se sustentar, pois, a mistura das duas características citadas, mais atrapalha do que ajuda. É algo novo e criativo, mas não muito eficiente, a não ser pelo gore.

Como minha intenção não é revelar partes do filme, terei cuidado em debatê-lo, com quem já viu e não viu.

O filme começa com uma garota fugindo do cativeiro aonde vinha sendo abusada e torturada. Seu nome é Lucie (Mylène Jampanoï) e é tratada e numa instituição de tratamento psiquiátrico. Lá ela conhece e cultiva uma amizade, mesmo que frágil com uma outra garota de nome Anna (Morjana Alaoui). Adulta então, Lucie ainda sofre com os traumas da infância alimentando e cultivando o sentimento de ódio e dor e ainda sofrendo com constantes aparições de uma garota morta que a persegue e a tortura. Logo vemos o processo de vingança, onde Lucie massacra uma família a sangue frio julgando-os como os culpados do abuso que sofrera antigamente.

Desde o início do filme vemos a influência do cinema japonês, levando até mesmo à sustos, mesmo que a proposta toda do filme não seja essa, mas criar tensão e desconforto. Então, é isso, o filme começa com traços japoneses e, de repente cai no explitation americano, misturando então os dois e criando uma bagunça de subgêneros e ousando ainda dramatizar o filme, que é a única ferramenta que consegue ligar as outras duas e a salvação total do filme. Daí para frente, qualquer revelação são detalhes fundamentais para a compreensão da trama que promete complicar mais ainda e, às vezes, surpreender quando não revoltar. O que podemos notar também é a mudança repentina de clima. Depois da mistura do terror japonês e americano, vemos um outro subgênero, o terror psicológico e, de certa forma, snuff (porém irreal, claro).


Mesmo que o filme tente puxar descaradamente para o lado do estudo psicológico e conseqüências de traumas, ele não consegue convencer, usa isso apenas para gerar mais terror e tornar a obra mais comercial. A trama do filme, quando revelada soa falsa e “nova”, pois é um tema curioso e estranho, diferente, algo ainda não abordado em filmes do gênero. Desde a maneira como é revelada, como a maneira que é executada, o filme soa apelativo. De qualquer forma, a idéia é muito boa e o encaminhamento para o final (antes do final contraditório) é excelente. O drama e o surreal, a insanidade do filme consegue ser um grande atrativo, como eu já disse, por ser uma trama nova.

O filme em si então consegue, não criticar algo, mas alertar para a curiosidade humana que pode extrapolar o limite do próprio ser e se tornar algo, não construtivo, mas completamente destrutivo, perder a razão. O poder da curiosidade, o poder do medo sobre o ser humano.


(este trecho, não necessariamente contém spoilers, mas pode conter algo sugestivo em relação ao desfecho)
Em fim, o final consegue ser mais contraditório que a salada de subgêneros durante o filme. É uma forma de dizer que as coisas devem ser como são e nada deve ser forçado, que a curiosidade pela busca levou a chegar em um segredo que não deve ser revelado? Ou, ainda em base nessa primeira hipótese, é uma forma de cultivar a violência e a procura pelo segredo? Ou então é a insanidade daquela que retém o segredo e quer desfrutar dele para si mesma ignorando os outros e o valor de sua descoberta para o mundo. De qualquer forma, cabe a uma interpretação pessoal.

Os realizadores do filme sofreram com a censura que classificava o filme para maiores de dezoito anos sendo que o objetivo deles era fazer um filme com uma classificação dezesseis, simplesmente por acharem o tema algo que deva ser expandido e visto por uma massa maior de pessoas. Geralmente e normalmente, a classificação dezoito anos, a máxima, é um fator positivo para filmes extremos, “exploitations”, pois chama o público que procura por estes filmes. Depois de muito apelo, eles conseguiram a tão desejada classificação de dezesseis anos na França.

Mesmo assim, o filme é extremamente violento e deve ser visto por aqueles que já vêm curtindo o gênero desde filmes como “A Invasora”, “A Fronteira” e “Alta Tensão”, todos franceses e com um gore extremo e que tem um roteiro no mínimo interessante e original. Agora vem a notícia ruim, ou melhor, péssima: o promissor diretor deste filme está, atualmente trabalhando em Hollywood, e adivinhem... fará um remake deste filme. Aconselho, mesmo desconhecendo este remake que assistam a este filme antes que, mesmo deixando a desejar em alguns aspectos, vale a pena.





Avaliação: 7/10
Por Pedro Ruback

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