terça-feira, 11 de outubro de 2011

A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (Especial de Halloween 2011)

Sleepy Hollow (1999)
Dirgido por Tim Burton, com Johnny Depp, Christina Ricci, Jeffrey Jones, Michael Gambon, Miranda Richardson, Casper Van Dien, Christopher Walken, Martin Landau, Lisa Marie e Christopher Lee.

Palavras-chave: lenda, bruxaria, assassinatos em série


O Cavaleiro Sem-Cabeça foi visto frequentemente. Um velho homem que não acreditava em fantasmas contou que encontrou o cavaleiro vindo do desfiladeiro. O cavaleiro o perseguira atravessando arbustos, colinas e pântanos. Ao chegarem a uma ponte, o cavaleiro subitamente se transformou num esqueleto. Ele jogou o velho dentro do riacho e saltou por sobre as copas das árvores, trotando num barulho de trovão.
Trecho da obra original, do criador germânico Karl Musäus.

Burton e Depp têm uma parceria interessante. Parece que a partir da maravilhosa atuação como Edward em Edward Scissorhands, Depp adquiriu uma enorme confiança sobre Burton que lhe deu papéis e mais papéis para excêntricos personagens em seus excêntricos filmes. Parece que Depp se encaixou perfeitamente como o louco engraçado, ou o esquisito, curioso e amável. Aqui em Sleepy Hollow, Depp continua com características semelhantes, não iguais nem tão originais como Edward (que acabou virando marca tanto de Burton como de Depp).

Depp incorpora Ichabod Crane, um detetive que acredita na ciência e na razão, e não no sobrenatural, em meio a uma época em que o povo vivia colocando culpa no sobrenatural por ser uma forma mais fácil de convencer a população e obter méritos. Crane se vê na árdua tarefa de desvendar cientificamente uma série de acontecimentos misteriosos e aparentemente místicos na cidadezinha de Sleep Hollow. A população está assombrada, pois dizem que, por bruxaria, um homem de armadura negra e cavalo negro rodeava a cidade decaptando as pessoas e levando embora suas cabeças.

Não assustado por isso, Crane parte em busca da resposta e se depara com coisas que não acreditava: magia, bruxaria. Burton, como sempre, nos trouxe mais uma obra com seus toques sombrios, uma climatização perfeita (principalmente por não ser um filme leve, há bastante violência). Todo o cenário foi perfeitamente construído nos conformes de seu gosto e cada detalhe se tornou fundamental, desde árvores secas e velhas à construções tortas e podres, florestas e milharais assustadores.

Depp está ótimo e cômico, o seu personagem varia do sério para o ingênuo rapidamente, tornando-o simpático e cativante. Os outros atores estão bem, sempre, mas não fazer o mesmo que Depp, não trazem muito de novo e não há nada marcante realmente. Todo aquele clima assustador misturado ao humor negro de Burton está presente também no filme. Para quem é fã e aprecia os filmes de Burton, esse filme é obrigatório, com certeza!


Sobre o livro: (não há aqui spoilers sobre o filme)

Washington Irving, famoso escritor nova-iorquino contemporâneo ao processo de solidificação da independência dos Estados Unidos, conhecido também por ter escrito clássicos contos como o de título filme e “Rip van Winkle”, no qual conta a história do personagem título que foge de sua esposa má e adormece sob uma árvore acordando vinte anos depois e tendo de se adaptar às mudanças do mundo.

É visível que Washington Irving baseou seu conto de horror numa lenda germânica trazida pelos imigrantes alemães para a América. O trecho citado acima relata que O Cavaleiro Sem-Cabeça não consegue passar por uma determinada ponte, a mesma ponte onde se deu o desfecho do conto de Irving.



(Abaixo, spoilers sobre o livro, mas não acho que comprometa a diversão)
Um dos primeiros exemplos de ficção norte-americana, A Lenda do Cavaleiro Sem-Cabeça (livro), é um conto simples envolvendo uma situação por volta de 1790, a qual se passa em uma cidade de nome Sleep Hollow, onde, Ichabod Crane compete com um valentão pela mão de uma jovem de dezoito anos chamada Katrina van Tassel. Quando, durante a noite, Crane deixa a festa, é perseguido pelo Cavaleiro Sem-Cabeça, fantasma de um cavaleiro germânico que tinha tido a cabeça arrancada por uma bola de canhão durante uma guerra durante a Revolução Americana. Nisso, Crane desaparece, deixando em aberto a história e nos fazendo pensar se o Cavaleiro Sem-Cabeça é na realidade um espírito ou apenas o valentão disfarçado.




Avaliação: 9/10

Por Pedro Ruback

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

O Grupo Baader Meinhof

Der Baader Meinhof Komplex (2008)
Dirigido por Uli Edel, com Martina Gedeck, Moritz Bleibtreu, Johanna Wokalek, Bruno Ganz, Simon Licht, Jan Josef Liefers, Alexandra Maria Lara, Hannah Herzsprung e Heino Ferch.

Palavras-chave: violência, anarquia, política


A Segunda Guerra Mundial tinha terminado apenas há 20 anos. Os que comandam a polícia, as escolas, o governo, eram as mesmas pessoas que estavam no comando durante o nazismo. O chanceler, Kurt Georg Kiesinger, era um ex-nazista. As pessoas só começaram a discutir isso nos anos 60. Nós éramos a primeira geração nascida desde a guerra, e estávamos fazendo perguntas aos nossos pais. Por causa do passado nazista, tudo de ruim era comparado ao Terceiro Reich. Se você ouvia falar de brutalidade policial, diziam que era igual à SS. No momento em que você vê seu próprio país como a continuação de um Estado fascista, você se dá a permissão de fazer quase qualquer coisa contra ele. Você vê as suas ações como a resistência que seus pais não tiveram.

Stefan Aust, autor do livro biográfico sobre a RAF, Der Baader Meinhof Komplex



A química auto-destrutiva do filme reina durante suas duas horas e meia de duração, fazendo com simplicidade e delicadeza um filme pesado fluir sem sensibilidade ou fragilidade (aspecto técnico), o que é bom, pois a história depende pelo menos disso para não ser apenas mais uma, para não beirar o odiado moralismo que alguns filmes ultimamente têm passado, se trata de algo duro e frágil, um momento da sociedade onde a rebeldia e o senso de justiça beiravam o absurdo, o momento em que os hormônios juvenis estavam prontos para explodir depois de um passado caótico e destrutivo. Os jovens queriam que isso não se repetisse (Segunda Guerra Mundial), queriam acabar com o fascismo, criando a anarquia, que é um modo de se libertar da sociedade, um modo de se sentir livre para fazer o que quiser, onde ninguém é Deus e Deus parece ser ninguém.

Não podia haver um líder, não podia haver uma pessoa que liderava um país, muito menos uma pessoa que deveria ser “melhor” financeiramente que outras. O comércio deveria parar de ser algo para alguns, deveria ser acessível para todos. Um pensamento comunista que dominava a mente dos jovens na década de 70 e 80 que muitas vezes eram interpretados de formas erradas e diferentes. O filme expõe uma ótica comum do tema quando o assunto é um grupo rebelde contra o governo. Uma ascensão rápida no início, gerando seguidores por todo um país ou continente e repentinamente uma queda brusca onde os idealizadores do movimento caem e sobram os seguidores, estes que não têm controle e passam a fazer o que acham que é certo sem um apoio adequado ou “inteligente” levando a um conflito antes inexistente, de certa forma, perdendo a razão.


O grupo Baader-Meinhof foi um grupo de extrema-esquerda formada na Alemanha que tinham como inimigos os burgueses. Eles temiam e acreditavam que o capitalismo fosse a nova arma do fascismo. Esse grupo tinha como objetivo acabar com o capitalismo, agindo radicalmente. No início eles focaram em protestos contra a guerra no Vietnã, a pobreza no terceiro mundo e a energia nuclear (que aliás, são ótimos temas para debates e protestos). Outro fator que levavam esses jovens a agirem tão radicalmente foi o fato de, a maioria dos políticos que atuavam em seus cargos da época eram ex-fascistas ou tinham um pé com isso.

O filme foi acusado de querer promover tal movimento na atualidade por mostrar uma glorificação dos integrantes do grupo, mesmo que em partes mostre sua queda. Há festas, liberdade, atitude e independência, além de um senso de radicalismo e voz que hoje é reprimido nos filmes. Há grande adrenalina também. Mas como mostrar uma história real sem pelo menos tentar imitar o real, o que realmente aconteceu? Não há porque fazer um filme baseado em fatos, ainda mais do ponto de vista dos jovens do filme, sem mostrar o que para eles foi aquele momento. Claro que foi glorificante, claro que houve adrenalina e liberdade, houve trabalho em equipe e iniciativa! Mas o que muitos não entendem é que o mundo está mudando e as pessoas já são conscientes de que certos movimentos e certas atitudes geram graves conseqüências e, com base no já ocorrido no passado, nunca irão querer repetir e, se isso acontecer, os mesmo erros não serão cometidos, o que é óbvio.

De qualquer forma, diversas coisas eles alcançaram. Não só violência, não só vandalismo e não só anarquia, eles fizeram com que as pessoas mudassem sua ótica perante os jovens, que os jovens estão muito mais preocupados com o mundo que antes e somos (digo “somos” porque eu também sou jovem) capazes de qualquer coisa para fazer com que ele se torne um lugar justo e igual para todos.




Avaliação: 9/10
Por Pedro Ruback

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A Inês

Não me sorrias à sombria fronte,
Ai! sorrir eu não posso novamente:
Que o céu afaste o que tu chorarias
E em vão talvez chorasses, tão somente.

E perguntas que dor trago secreta,
A roer minha alegria e juventude?
E em vão procuras conhecer-me a angústia
Que nem tu tornarias menos rude?

Não é o amor, não é nem mesmo o ódio,
Nem de baixa ambição honras perdidas,
Que me fazem opor-me ao meu estado
E evadir-me das coisas mais queridas.

De tudo o que eu encontro, escuto, ou vejo,
É esse tédio que deriva, e quanto!
Não, a Beleza não me dá prazer,
Teus olhos para mim mal têm encanto.

Esta tristeza imóvel e sem fim
É a do judeu errante e fabuloso
Que não verá além da sepultura
E em vida não terá nenhum repouso.

Que exilado - de si pode fugir?
Mesmo nas zonas mais e mais distantes,
Sempre me caça a praga da existência,
O Pensamento, que é um demônio, antes.

Mas os outros parecem transportar-se
De prazer e, o que eu deixo, apreciar;
Possam sempre sonhar com esses arroubos
E como acordo nunca despertar!

Por muitos climas o meu fado é ir-me,
Ir-se com um recordar amaldiçoado;
Meu consolo é saber que ocorra embora
O que ocorrer, o pior já me foi dado.

Qual foi esse pior? Não me perguntes,
Não pesquises por que é que consterno!
Sorri! não sofras risco em desvendar
O coração de um homem: dentro é o Inferno.


Lord Byron

Estâncias para Música

Alegria não há que o mundo dê, como a que tira.
Quando, do pensamento de antes, a paixão expira
Na triste decadência do sentir;
Não é na jovem face apenas o rubor
Que esmaia rápido, porém do pensamento a flor
Vai-se antes de que a própria juventude possa ir.
Alguns cuja alma bóia no naufrágio da ventura
Aos escolhos da culpa ou mar do excesso são levados;
O ímã da rota foi-se, ou só e em vão aponta a obscura
Praia que nunca atingirão os panos lacerados.
Então, frio mortal da alma, como a noite desce;
Não sente ela a dor de outrem, nem a sua ousa sonhar;
toda a fonte do pranto, o frio a veio enregelar;
Brilham ainda os olhos: é o gelo que aparece.
Dos lábios flua o espírito, e a alegria o peito invada,
Na meia-noite já sem esperança de repouso:
É como na hera em torno de uma torre já arruinada,
Verde por fora, e fresca, mas por baixo cinza anoso.
Pudesse eu me sentir ou ser como em horas passadas,
Ou como outrora sobre cenas idas chorar tanto;
Parecem doces no deserto as fontes, se salgadas:
No ermo da vida assim seria para mim o pranto


Lord Byron

Adeus

Adeus! e para sempre embora,
Que seja para nunca mais:
Sei teu rancor - mas contra ti
Não me rebelarei jamais.

Visses nu meu peito, onde a fronte
Tu descansavas mansamente
E te tomava um calmo sono
Que perderás completamente:

Que cada fundo pensamento
No coração pudesses ver!
Que estava mal deixá-lo assim
Por fim virias a saber.

Louve-te o mundo por teu ato,
Sorria ele ante a ação feia:
Esse louvor deve ofender-te,
Pois funda-se na dor alheia.

Desfigurassem-me defeitos:
Mão não havia menos dura
Que a de quem antes me abraçava
Que me ferisse assim sem cura?

Não te iludas contudo: o amor
Pode afundar-se devagar;
Porém não pode corações
Um golpe súbito apartar.

O teu retém a sua vida,
E o meu, também, bata sangrando;
E a eterna idéia que me aflige
É que nos vermos não tem quando.

Digo palavras de tristeza
Maior que os mortos lastimar;
Hão de as manhãs, pois viveremos,
De um leito viúvo despertar.

E ao achares consolo, quando
A nossa filha balbuciar,
Ensiná-la-ás a dizer "Pai",
Se o meu desvelo vai faltar?

Quando as mãozinhas te apertarem
E ela teu lábio -houver beijado,
Pensa em mim, que te bendirei
Teu amor ter-me-ia abençoado.

Se parecerem os seus traços
Com os de quem podes não mais ver,
Teu coração pulsará suave,
E fiel a mim há de tremer.

Talvez conheças minhas faltas,
Minha loucura ninguém sabe;
Minha esperança, aonde tu vás,
Murcha, mas vai, que ela em ti cabe.

Abalou-se o que sinto; o orgulho,
Que o mundo não pôde curvar,
Curvou-se a ti: se a abandonaste,
Minha alma vejo-a a me deixar.

Tudo acabou - é vão falar -,
Mais vão ainda o que eu disser;
Mas forçam rumo os pensamentos
Que não podemos empecer.

Adeus! assim de ti afastado,
Cada laço estreito a perder,
O coração só e murcho e seco,
Mais que isto mal posso morrer.




Lord Byron

O Oceano

Rola, Oceano profundo e azul sombrio, rola!
Caminham dez mil frotas sobre ti, em vão;
de ruínas o homem marca a terra, mas se evola
na praia o seu domínio. Na úmida extensão
só tu causas naufrágios; não, da destruição
feita pelo homem sombra alguma se mantém,
exceto se, gota de chuva, ele também
se afunda a borbulhar com seu gemido,
sem féretro, sem túmulo, desconhecido.

Do passo do há traços em teus caminhos,
nem são presa teus campos. Ergues-te e o sacodes
de ti; desprezas os poderes tão mesquinhos
que usa para assolar a terra, já que podes
de teu seio atirá-lo aos céus; assim o lanças
tremendo uivando em teus borrifos escarninhos
rumo a seus deuses - nos quais firma as esperanças
de achar um portou angra próxima, talvez -
e o devolves á terra: - jaza aí, de vez.

Os armamentos que fulminam as muralhas
das cidades de pedra - e tremem as nações
ante eles, como os reis em suas capitais - ,
os leviatãs de roble, cujas proporções
levam o seu criador de barro a se apontar
como Senhor do Oceano e árbitro das batalhas,
fundem-se todos nessas ondas tão fatais
para a orgulhosa Armada ou para Trafalgar.

Tuas bordas são reinos, mas o tempo os traga:
Grécia, Roma, Catargo, Assíria, onde é que estão?
Quando outrora eram livres tu as devastavas,
e tiranos copiaram-te, a partir de então;
manda o estrangeiro em praias rudes ou escravas;
reinos secaram-se em desertos, nesse espaço,
mas tu não mudas, salvo no florear da vaga;
em tua fronte azul o tempo não põe traço;
como és agora, viu-te a aurora da criação.

Tu, espelho glorioso, onde no temporal
reflete sua imagem Deus onipotente;
calmo ou convulso, quando há brisa ou vendaval,
quer a gelar o pólo, quer em cima ardente
a ondear sombrio, - tu és sublime e sem final,
cópia da eternidade, trono do Invisível;
os monstros dos abismos nascem do teu lodo;
insondável, sozinho avanças, és terrível.

Amei-te, Oceano! Em meus folguedos juvenis
ir levado em teu peito, como tua espuma,
era um prazer; desde meus tempos infantis
divertir-me com as ondas dava-me alegria;
quando, porém, ao refrescar-se o mar, alguma
de tuas vagas de causar pavor se erguia,
sendo eu teu filho esse pavor me seduzia
e era agradável: nessas ondas eu confiava
e, como agora, a tua juba eu alisava.


Lord Byron
(Tradução de Castro Alves)